Sei que ainda estou devendo a segunda parte das minhas experiências no Carnaval, mas não dá para simplesmente ignorar as últimas notícias sobre a cassação do mandato de Gilberto Kassab, que pegou a todos de surpresa.
É claro que a decisão ainda pode (e deverá) ser revertida, pois Kassab irá recorrer da decisão em várias instâncias. Mas, junto com a prisão do governador do DF, José Roberto Arruda, e a ameaça de cassação do mandato de seu vice, Paulo Octávio, a cassação de Kassab causa uma fissura irreparável na imagem de seu partido, o Democratas.
Ironicamente um filho da ditadura que jura, atualmente, ser o fiel paladino da democracia em nosso país, o DEM (outrora PFL) estava, desde a eleição de Lula no plano Federal, vestindo a máscara da integridade, da dignidade e do respeito às contas públicas. Usava essa máscara para vociferar contra as corrupções cometidas pelo PT e seus aliados, posando como defensor inquestionável da moralidade pública.
É claro que muitos de seus membros têm um histórico de ilegalidades já comprovadas - vide o falecido "coroné" Antônio Carlos Magalhães - mas, com o apoio da mídia, vários desses fatos foram simplesmente jogados para baixo do tapete, em prol de uma imagem de inviolabilidade ética dos partidos que se opõem ao PT.
Agora, contudo, acusações de improbidades administrativas atingem um nível que impede qualquer camuflagem: a corrupção escancarada do Governo Arruda e a ilegalidade das doações para a campanha de Kassab estraçalham, finalmente, a máscara da moralidade que a oposição vestia. O PSDB, é verdade, ainda atravessaquase intocável a situação presente - sem dúvida, devido à sua habilidade de manter as acusações contra seus membros no plano da irrelevância, com suporte quase integral da grande mídia. Mas fica difícil acreditar que a queda da imagem de seu maior aliado não respingará na carapaça moralista do partido de José Serra.
A generalização da exposição das ilegalidades e casos de corrupção pode, quem sabe, enfraquecer uma forma individualizada de analisar a política, que teme em simplificar a questão da corrupção ao plano das personalidades individuais dos políticos - como se o problema se resumisse à constituição "naturalmente imoral" de alguns governantes, e de seus respectivos partidos.
Ora, deveria ser mais do que óbvio que esse gravíssimo problema da política nacional não se resume à moralidade de seus agentes, tratando-se, antes disso, de um problema sistêmico. PT, PMDB, DEM, PSBD, PPS, etc, etc... uma vez que alcancem o poder, todos estão sujeitos às regras estruturais que o sustenta. Pouquíssima capacidade de manobra é conferida àqueles que procuram manter seus princípios éticos incólomes. Todos devem vender, ao menos parcialmente, sua moral para se adequar a tal sistema - indissociável, da forma como está estruturado, de atuações imorais aos olhos da população.
Apenas uma reforma política séria, profunda e de grandes proporções - que estabeleça, por exemplo, o financiamento exclusivamente público das campanhas - poderá ter alguma chance contra a corrupção generalizada que, há séculos, assola nosso país. Mesmo que não eliminemos o monstro tão cedo, é importante que, ao menos, o enfraqueçamos para viabilizar sua morte futura, privando-o das proteínas e carboidratos que o mantém tão saudável. As últimas ações da justiça, atuando sem diferenciar partidos e forças políticas, criam boas esperanças nesse sentido (só para constar, o mesmo juiz que pediu a cassação de Kassab também acusou Marta Suplicy e o tucano Geraldo Alckmin pela mesma espécie de irregularidade das doações de campanha de 2008).
Pedro Mancini
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