Estou abismado com a agressividade demonstrada por alguns humoristas, no Twitter, sobre o suicídio, ao comentarem sobre a morte de Leila Lopes.
Rafinha Bastos, do CQC, para além de qualquer piada de mau gosto, chegou a afirmar que "suicida tem mais é que se foder".Como seu colega de programa Danilo Gentilli, ao expor uma piada acusada de teor racista meses atrás, o comediante consegue piorar uma piada ruim com comentários posteriores, de defesa, que mais "queimam seu filme" do que "livram sua cara".
Ao dizer que os suicidas tem mais é que se foder, Bastos deixa de apenas guardar mais umas piadas de péssimo gosto em seu currículo para tecer um comentário desrespeitoso, agressivo e intolerante. É claro que logo seus defensores surgem das profundezas, buscando distorcer as circunstâncias ao taxarem os críticos de Bastos de intolerância e "corretismo político"!!
(Aqui, eu poderia acrescentar a hipocrisia presente nesse raciocínio "CQCniano": eles acusam os críticos de serem politicamente corretos, mas se acham no direito de tecer comentários moralistas sobre o comportamento de celebridades e políticos nacionais.Quem, afinal, é hipócrita nessa história?)
Rafinha cai, ainda, no senso comum ao abstrair todas as configurações sociais que levam as pessoas a cometerem suicídios, responsabilizando, de forma simplista, o suicida por sua atitude - além de demonstrar grande raiva com relação a essa "solução final", dada por pessoas desesperadas, mostrando um certo moralismo sobre o valor da vida.
De modo similar, os doentes são progressivamente responsabilizados por suas doenças - como uma vítima do câncer, da Aids ou de um ataque cardíaco, com seus estilos de vida e comportamentos passados vistos como únicos fatores causadores das enfermidades. Indo mais longe, garotas como a da Uniban e milhares de mulheres estupradas, vítimas de violência sexual igualmente injustificável, são vistas como grandes causadoras das desgraças que as assolam - como se, indiretamente, respaldassem as ações de seus agressores pelos seus comportamentos "moralmente questionáveis".
Como Durkheim, o pai da Sociologia, já demonstrou, os suicídios, para além das motivações subjetivas dos indivíduos, possuem causas sociais. É preciso entender quais são as características circunstanciais da sociedade contemporânea que tornam atraentes às pessoas se absterem de viver, mergulhando na morte. Declarações de figuras públicas nacionais, como Rafinha Bastos, sobre o assunto, apenas escondem a questão nas profundezas de um quarto escuro, isolado dum debate público sobre a sociedade que nos rodeia.
Pedro Mancini
3 comentários:
Pedro, talvez vc, eu e outros, estejamos no País errado. Deve haver um lugar no mundo onde exista menos preconceito. Abraço Forte!
paladino.
Falando em hipocrisia, esse Rafinha (se não estou trocando as bolas), apareceu no programa do João Gordo, Gordo visita, e lá afirmou que anos antes, quando as coisas não estavam uma maravilha pra ele, ele usava drogas e era alcoólatra. Na boa, prefiro me matar ao invés de usar drogas para não viver a realidade!
E falando a verdade, alguém considera CQC, alguma coisa além de um programa humorístico de mau gosto?
Olha, ou acho que eles têm quadros interessantes sim (como o de denúncias, que cobra das autoridades soluções para problemas públicos específicos).
Mas, como tudo nos tempos atuais, eles não escapam da ambigüidade: são inovadores e progressistas em determinados aspectos, mas revelam, em outros, uma faceta arcaica, conservadora e hipócrita (ambigüidade presente, de fato, na cultura típico-ideal da classe média, da qual são grandes herdeiros).
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