Uma das maiores forças que levam muitas pessoas a tomarem certas atitudes com relação ao próprio corpo e a moldar seu comportamento em público é um enorme pavor por se parecer insosso aos olhos dos outros. Explico.
Em uma sociedade profundamente marcada pelas aparências e por um individualismo qualitativo exacerbado e voltado "para fora", não há exigência mais constante para a vida social do que a de se parecer "descolado", "sedutor" e "interessante". E o uso do "parecer", aqui, não é banal: deve-se portar e emitir SINAIS EXTERIORES CLAROS, APARENTES, capazes de IDENTIFICAR AS CARACTERÍSTICAS "DESCOLADAS" da personalidade individual. Podem entrar em cena, aqui, as inúmeras tatuagens que permeiam os corpos plásticos contemporâneos, o cuidado extremado com o corpo em geral, o uso de piercings e outras marcas visíveis, que trazem a informação de que o indivíduo portador é "corajoso", "alternativo" e que "tem personalidade".
Itens de vestuário mais "personalizados" parecem cumprir função similar de destaque do indivíduo em meio à massa da indiferença (e, dialeticamente, de conformação e identificação a certos grupos sociais). As roupas, assim, também podem exprimir sinais corporais de um "eu performático" voltado inteiramente para se provar a posse de características pessoais socialmente valorizadas - que, de outro modo, desapareceriam no universo preto e branco da intimidade insulada.
É claro que, por um lado, falo de um fenômeno já discutido exaustivamente pela Sociologia, pela Psicologia e por disciplinas relacionadas: a velha dialética da socialização composta, concomitantemente, por movimentos de conformação e diferenciação. Quem adota um estilo estético preocupa-se, ao mesmo tempo, em se sentir inserido nos grupos com os quais se relaciona (e, nesse sentido, "pega mal" não se mostrar descolado ou antenado com a moda) e em destacar-se individualmente desse grupo como um ser de personalidade própria, inconfundível com qualquer outro.
Para exemplificar, a vontade de se tatuar pode traduzir a necessidade de conformação e identificação a grupos (genéricos ou específicos) de tatuados - tidos, pela sociedade, como indivíduos mais "descolados" que a média; já o desenho selecionado para se tatuar pode derivar de uma experiência íntima própria, capaz de conferir um sentido único a essa marca e exprimir uma identidade pessoal inconfundível ao portador perante os demais. Mas parece que, nos dias atuais, o segundo movimento da dialética da socialização - a diferenciação ou individualização propriamente dita - predomina sobre a mera conformação ou adequação aos grupos (mais na intenção do que na prática, já que chegamos a um ponto em que se tornou difícil considerar que uma tatuagem destaque qualquer um perante uma massa de indivíduos portando o mesmo tipo de sinal corporal). Aqueles que marcam o corpo parecem, para mim, mais motivados por uma vontade de diferenciação do que de mera conformação social; e essa necessidade é indissociável da exposição pública de sinais personalizados e individualizantes.
Itens de vestuário mais "personalizados" parecem cumprir função similar de destaque do indivíduo em meio à massa da indiferença (e, dialeticamente, de conformação e identificação a certos grupos sociais). As roupas, assim, também podem exprimir sinais corporais de um "eu performático" voltado inteiramente para se provar a posse de características pessoais socialmente valorizadas - que, de outro modo, desapareceriam no universo preto e branco da intimidade insulada.
É claro que, por um lado, falo de um fenômeno já discutido exaustivamente pela Sociologia, pela Psicologia e por disciplinas relacionadas: a velha dialética da socialização composta, concomitantemente, por movimentos de conformação e diferenciação. Quem adota um estilo estético preocupa-se, ao mesmo tempo, em se sentir inserido nos grupos com os quais se relaciona (e, nesse sentido, "pega mal" não se mostrar descolado ou antenado com a moda) e em destacar-se individualmente desse grupo como um ser de personalidade própria, inconfundível com qualquer outro.
Para exemplificar, a vontade de se tatuar pode traduzir a necessidade de conformação e identificação a grupos (genéricos ou específicos) de tatuados - tidos, pela sociedade, como indivíduos mais "descolados" que a média; já o desenho selecionado para se tatuar pode derivar de uma experiência íntima própria, capaz de conferir um sentido único a essa marca e exprimir uma identidade pessoal inconfundível ao portador perante os demais. Mas parece que, nos dias atuais, o segundo movimento da dialética da socialização - a diferenciação ou individualização propriamente dita - predomina sobre a mera conformação ou adequação aos grupos (mais na intenção do que na prática, já que chegamos a um ponto em que se tornou difícil considerar que uma tatuagem destaque qualquer um perante uma massa de indivíduos portando o mesmo tipo de sinal corporal). Aqueles que marcam o corpo parecem, para mim, mais motivados por uma vontade de diferenciação do que de mera conformação social; e essa necessidade é indissociável da exposição pública de sinais personalizados e individualizantes.
Do mesmo modo que não basta ter opiniões próprias e tocar atividades cotidianas sem expô-las nas redes sociais (videm postagem anterior), já não basta possuir hobbies e passar por experiências pessoais tidas como biograficamente enriquecedoras: é preciso ESCANCARAR essas vivências, direta ou indiretamente; transformar-se em um aparato simbólico ambulante de indicação dessas experiências íntimas. Tais sinais servem como indício "irrefutável" de que somos pessoas interessantes, com experiências de vida significativas - que não merecem, portanto, ser classificadas como "insossas", "sem sal" ou sem graça. Tatuagens, piercings e roupas "maneiras" podem se reduzir, assim, ao papel de atestados simbólicos de que somos pessoas com quem vale a pena se relacionar.
Não desprezo, aqui, as experiências particulares que se externalizam em marcas corporais: hobbies, relacionamentos, experiências religiosas, músicas, bandas e filmes favoritos... temas que nos envolvem, nos marcam, nos seduzem. Todos compomos mentalmente nossas biografias, conferimos artificialmente nossas identidades pessoais, com base nessas experiências e gostos. O interessante, para mim, é essa aparente obsessão em criar e carregar sinais que "materializam" essas experiências, traduzindo-as em formas físicas observáveis a olho nu; como se elas fossem capazes de transcender a esfera da imaterialidade, dos sonhos e da memória, ao serem transpostas para a pele - e, nesse estado, percebidas, observadas e elogiadas aos olhos da sociedade. Não basta viver ou sonhar: é preciso registrar e exibir. E eis que convertemo-nos, indiretamente, em peças publicitárias de nós mesmos: exteriorizando vivências, acreditamos que não seremos abandonados, como mercadorias obsoletas e insossas, na prateleira do competitivo mercado de orgulhos em que estamos imersos.
Pedro Mancini
Pedro Mancini