domingo, 12 de setembro de 2010

Palhaços na política

As grandes falhas de nosso sistema político ganham maior evidência a cada horário eleitoral.Um dos sinais mais óbvios dessas deficiências, que saltam aos olhos de todos, são as candidaturas "palhaças" e as "anti-candidaturas": candidatos famosos, na maioria das vezes sem propostas objetivas, que esperam ganhar as eleições com o apoio de seu carisma e dos fãs que conquistam. No caso das anti-candidaturas, conta-se, ainda, com supostos "votos de protesto" de eleitores desiludidos com o sistema político-eleitoral. Em geral, trata-se de  tipos engraçados ou com outras qualidades extra-políticas, que cativam seu público por algum talento ou característica pessoal. Inúmeros exemplos dessas candidaturas podem ser listados: Enéas, Havanir, Clodovil, Dinei, Sérgio Mallandro, e os mais atuais Tiririca, Maguila, Mulher Pêra e Mulher Melão.

Em outros momentos, essas candidaturas limitavam-se, quase absolutamente, a partidos menores, que aproveitavam "micro celebridades" para alcançar um lugarzinho na câmara ou para barganhar apoios políticos com partidos de maior relevância. Em geral, apoiavam a direita e a centro-direita: partidos como PSDB, DEM e PMDB. Agora, mais do que nunca, além de os grandes partidos também contarem com essas proto-celebridades, a centro-esquerda, simbolizada por PT e aliados, utiliza esse mesmo tipo de candidatura a seu favor, de forma direta ou indireta. Tiririca, a título de exemplo, é representante de um partido aliado de Aloizio Mercadante em São Paulo - o PR. A Mulher Pêra, por sua vez, conta com o apoio explícito do senador petista Eduardo Suplicy. Vejam os respectivos vídeos:









Essa aliança entre esquerda moderada e partidos menores, com suas candidaturas de "palhaçada" e suas anti-candidaturas, são uma boa demonstração do quanto a centro-esquerda brasileira aprendeu a ser pragmática, aderindo inteiramente às mazelas de nosso sistema político-eleitoral em prol de melhores possibilidades de governança. Essa postura não deixa de ter suas vantagens, como maior garantia de conquista de posições políticas e maior apoio parlamentar, benefícios esses que, se desprezados, resultariam em um isolamento desses partidos no espectro mais marginal do cenário político.


A incorporação relativa da imoralidade pela esquerda é igualmente uma demonstração de que o aparecimento de candidaturas palhaças, que fazem deboche com a política brasileira, não é um fenômeno isolado, dependente de "mal-caratismos" individuais; é, obviamente, um problema estrutural, de modo que todas as agremiações políticas de importância rendem-se a sua lógica para cativar o eleitor. 

E que não se enganem aqueles que consideram que um voto em Tiririca é um voto de "protesto": essa possibilidade já se extinguiu há um bom tempo. Foi-se o tempo de candidaturas-fantoche assumidas como a do Rinoceronte Cacareco, que simbolizavam, de fato, a insatisfação dos brasileiros com a política nacional. Nosso sistema político-eleitoral é muito flexível, tendo se adaptado com absoluto sucesso à idéia de "candidaturas de protesto", de modo que os sujeitos mais atrelados à lógica política mais podre são indiretamente beneficiados  pelos votos recebidos pelos "palhaços" de seus partidos. O caso de Tiririca é emblemático: um voto nesse comediante beneficiará candidatos como Valdemar Costa Neto, político que renunciou em 2005 para não ser removido à força de seu cargo parlamentar. Ironicamente, aquele que acredita estar "driblando" o sistema ao votar em Tiririca estará, de fato, colaborando de modo bem definido para a manutenção de sua lógica sistêmica.

Algumas vezes, contudo, é possível vislumbrar um pedacinho de ética no fim do túnel. O candidato ao governo de São Paulo pelo Partido dos Trabalhadores, Aloizio Mercadante, reclamou diretamente ao PR a respeito do conteúdo da "anti-candidatura" de Tiririca, que compromete a já muito debilitada imagem do político brasileiro. Há de se lamentar que críticas dessa espécie se reduzam aos candidatos com discursos mais esdrúxulos; os mais hipócritas, como Maguila, que fingem ter plataformas políticas mais sérias do que as do palhaço, parecem estar mais seguros da contestação pública e de quaisquer retaliações de partidos aliados. 


Essa tendência por candidaturas dos tipos apontados não cessará enquanto não houver uma reforma política séria em nosso país. Até lá, só nos resta tomar a postura mais coerente de votar em candidatos com propostas REAIS e CONCRETAS de mudança, políticos de conteúdo bem definido: essa sim seria uma atitude mais próxima daquele quase utópico "voto de protesto" que tantos buscam, com a grande vantagem de sua viabilidade e maior possibilidade de impacto junto à sociedade.


Pedro Mancini



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